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Uma Coluna Qualquer: “Dia de granja” – Por Dario Cabral da Silva Neto

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Dizer que só falo e escrevo do passado é um tanto maldoso, falo do passado pelo que ele deixa de história sem heróis, escrevo do passado que o caminho semeia nas laterais, pois no traço serpenteado do caminho meus olhos fotografam em cores tantas que; guardar passa a ser um caleidoscópio.

Busco o alinhamento do sentir com o crer ter passado pelo caminho outras vezes, assim… 

Deixo minha casa com uma bolsa de tecido, o endereço num pedaço de lembrança, minha primeira feira de verduras. Minha mãe duvida que consiga trazer tudo, meu pai olha-me medindo o quando cresci. 

Meus passos são os mesmos passos sem medidas e cheios de coragem, atravessar aquele portão com entrada em pedras, o telhado enfeitando mais que protegendo a avenida em cascalho, tantos pés de eucaliptos margeando-a, o ar sombreado pelas copas tão altas que a vontade de ser pássaro vinha à mente de menino.

Um lado só árvores, uma floresta para meu tamanho, do outro as construções da granja, os canteiros, a caixa d’água e o prédio da administração, outro portão, mais ruas em cascalhos, o posto de venda, tudo ali colhido, o funcionário tão prestativo.

A vontade de seguir outros passos naquele mundo tão vasto e tão bem cuidado. Eu feliz da vida,  encantava-me as sombras revelando desenhos na rua de cascalho, imaginava poder desfrutar o máximo daquela aventura, um dia de granja.

Os guardas a cavalo, sérios demais para uma beleza impar, a imponência dos animais bem cuidados, o suor brotando dos peitorais, o brilho das esporas nas botas e aquele olhar de cima para baixo dos guardas bastava para saber qual o meu papel ali.

Antes de seguir para o posto de venda, fui estrada adiante, uma curva suave uma subidinha de nada no relevo, a clareira abre-se e os laranjais, limoeiros, e outras frutas, o verde alinhado, pontilhados com frutos dourados, outros no meio termo, um ou outro funcionários na carpina, labuta salutar pela vida, pelo patrão e por tudo o que significava para nós outros mortais.

Sempre que parava sentia olhos que me observavam, medindo minhas intenções, cem celulares e filmadoras, aqueles olhos faziam seu papel, não demorava cinco minutos e lá vinha o guarda, chicote na mão, olhar duro, calado, imponente cavaleiro dos novos tempos.

Voltar era a ordem silenciosa, eu obedecia, não era tão bobo assim. Sentia o chiado do cascalho no tênis (conga, azul com solado cozido), vinha medindo os passos vinham alimentando meu coração com imagens, quem sabe um dia escreva algo sobre esta granja; pensava. 

O vento conversava com todos. O parecendo canto colaborava para meus pensamentos de conquistador, menino sonhador. Relembras daquela estrada em cascalho, de tudo o que mais imprimia em mim um ar nostálgico, creio foi o que me fez para o futuro o que sou.

Bolsa cheia, nem me importava com o peso, ou com a galinha viva cocoricando com o pescoço pra fora da bolsa, incerto seu destino, o meu voltar ali tantas quantas vezes fossem possível, era o meu desejo.

Eu era menino descobrindo uma selva no centro da cidade, era homem fazendo compras, eram meus passos que agora marcavam o cascalho, parecia até que o portão com base em pedras ficara pequeno, grande mesmo era minha alegria. 

Hoje, quando passo pela área, sinto uma pontada no peito, minhas memórias gritam para que volte a ser tudo igual, mas não, uma força maior destruiu tudo, progresso, necessidade de habitação, vontades distintas das minhas. Um amontoado de prédios, de casas, de ruas sem cascalhos, sem vida, sem cor e sem alegria, mas o mundo vem corroendo para o presente, vem acelerado, a caixa d’água é tão pequena, parece que ainda ouço aquela galinha cocoricando por um destino diferente, o tempo passou é certo, e por que não lembrar de vez em quando. Eu lembro e você?

Opinião:
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal AHora

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