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Mariane Coelho

Na coluna Sankofa, Mariane Coelho brinda o leitor com uma reflexão: “O branco que você veste”  

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Trinta e um de dezembro, virada de ano. Dia de celebração, agradecimentos, reunião com a família. Alguns imbitubenses preferiram curtir a virada no Canto da Praia da Vila, outros ousaram a Virada Mágica na Praia do Rosa. Ano novo, vida nova. Novos planos, novos sonhos, paz, amor, festa. Nesse clima é que grande maioria das brasileiras e brasileiros vão para as praias ou para qualquer outro local para esperar a chegada do dia primeiro. Mas afinal, a pergunta chave é, o que a grande maioria compartilha em comum nesse dia, além da alegria promovida pela festividade? A opção de usar roupas brancas!  

Foi nessa virada de ano, aliás, observando as pessoas vestidas de branco na beira-mar de Imbituba, que tive o insight para relatar para vocês o fato histórico que um griô me contou sobre os tradicionais trajes alvos de reveillon. Aliás, vocês já pararam para pensar de onde surgiu essa tradição de usar branco no ano novo? Honrando a profissão… lá vem História. 

 A tradição iniciou no Brasil pela famosa Praia de Copacabana – RJ. Mais precisamente, nas areias de Copacabana, com praticantes de religiões de matriz africana que se reuniam de branco para comemorar a entrada do novo ano e oferecer flores a rainha do mar, Iemanjá. Observadores, não praticantes, aos poucos passaram a usar branco também. Apreciaram a tradição e assim iniciou-se o costume de ir à praia na virada do ano e usar branco na esperança de um ano novo com paz. Sim, ao longo dos anos as pessoas tomaram por costume vestir branco e ir à praia de Copacabana inspiradas nas celebrações à Iemanjá de adeptos as religiões de matriz africana. Histórico, né?! Não sei quando chegou o espumante, nem a típica foto beijando o companheiro ou companheira com os fogos de artifícios atrás, mas é certo que aos longos dos anos essa tradição de usar roupas brancas na virada de ano tomou o país inteiro.  

É bom lembrar que a base dessa tradição se inicia na África, tanto com as vestes brancas quanto ao culto a Iemanjá. David Dias, sacerdote de umbanda e pesquisador em Ciência da Religião na PUC – SP, contextualiza que “Iemanjá é um orixá, ou seja, uma divindade africana cultuada a partir do panteão divino dos povos iorubás. Embora, no Brasil, assuma títulos e características de “rainha do mar”, na África, é cultuada na região de Abeokutá, na Nigéria, onde seus cultos se estabeleceram inicialmente nas águas doces do rio Yemoja, entre Ifé e Ibadan”. 

Raoni Alves, para o g1 Rio, salienta que até o final da década de 50, a orla carioca não era um ponto de encontro tradicional para a virada de cada ano. Tudo mudou no início da década de 60 quando o sacerdote Tata Tancredo da Silva Pinto (“Tata” é um título que se dá a sacerdotes de algumas religiões de matrizes africanas) decidiu realizar encontros de grupos religiosos na Praia de Copacabana, antes da chegada do ano novo. Segundo pesquisadores, o objetivo de Tancredo era diminuir o preconceito que as religiões de origem africana sofriam na época. Tata Tancredo foi o precursor das reuniões religiosas na Praia de Copacabana e de certo modo, influência do uso dos trajes brancos na passagem no ano.  

Tancredo da Silva Pinto é considerado o organizador do culto Omoloko no Brasil e o responsável direto pela reunião dos adeptos dos cultos afro-brasileiros em Federações Umbandistas para defender o seu direito de ter e cultuar uma religião afro-brasileira. Segundo Mario Fillho, para o site do Templo Pantera Negra, seu nome religioso (Sunna) era Fọ̀lkétu Olóròfẹ̀. Tantacrendo foi chamado, muitas vezes, de o “Papa Negro da Umbanda”.  

Historicizando, é sempre bom lembrar que o Estado brasileiro, através da aplicação do Código Penal de 1890, já chegou a proibir a prática da religiosidade afro-brasileira, definindo-a como “xamanismo e magia negra”. Repressão instaurada por lei dois anos após a abolição da escravatura, inspirada a partir dos ideais de embranquecimento da população e efetivada em um país que acabara de escravizar por 300 anos milhões de africanos e afrodescendentes.  E ainda há quem se nega a discutir dívida histórica nesse país. O Brasil, com a maior população negra fora da África, país de maioria preta, esse que no dia trinta e um de dezembro, na virada de ano, se veste de branco.  

Fato histórico interessante, né? O griô que me contou pediu para eu não esquecer de finalizar com esse verso:  

intolerante religioso 

não faz ideia que o branco que veste 

para celebrar o ano novo 

vem da religião que diz ser da peste 

vem da matriz africana 

a origem do nosso povo 

Um feliz ano novo com muita paz! 

Na coluna Sankofa, Mariane Coelho brinda o leitor com uma reflexão: "O branco que você veste"   

Opinião:
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal AHora

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